SER E TEMPO

(ἀπόφανσις), na medida em que é autêntico, o dito no discurso deve ser extraído daquilo sobre o que se discorre, de tal maneira que a comunicação por discurso torne manifesto no dito e, assim, acessível ao outro aquilo sobre que se discorre. Essa é a estrutura do λόγος como ἀπόφανσις. Nem todo “discurso” possui esse modus do tornar manifesto, no sentido do fazer-ver que-mostra. A prece (εὐχή), por exemplo, também torna manifesto, mas de outro modo.

Na execução concreta, o discorrer (o fazer-ver) tem o caráter do falar, da proferição vocal em palavras. [33] O λόγος é φωνή, mais precisamente, φωνή μετὰ φαντασίας — proferição vocal em que cada vez algo é visto.

E somente porque a função do λόγος como ἀπόφανσις consiste cm fazer-ver algo mostrando é que o λόγος pode ter a forma estrutural da σύνθεσις. Síntese não diz aqui ligar ou articular representações, lidar com ocorrências psíquicas a respeito das quais se deve então pôr o “problema” de como elas, enquanto algo interno, concordam com o que é físico lá fora. O συν tem aqui significação puramente apofântica e significa: fazer ver algo cm seu ser junto com algo, fazer ver algo como algo.

E, de novo, porque λόγος é um fazer-ver, pode ele por isso ser verdadeiro ou falso. Assim, tudo aqui consiste em ficar livre de um conceito de verdade construído no sentido de uma “concordância”. Essa ideia não é de modo algum primária, no conceito de ἀλήθεια. O “ser-verdadeiro” do λόγος como ἀληθεύειν significa: no λέγειν como ἀποφαίνεσθαι, tirar o ente de que se fala do seu encobrimento, fazendo-o ver como não-encoberto, descoberto (ἀληθές). De igual maneira, o “ser-falso” ψεύδεσθαι significa tanto como enganar, no sentido de encobrir: pôr algo diante de algo (no modo do fazer-ver) e, assim, dando-o como algo que ele não é.

Mas porque a “verdade” tem esse sentido e o λόγος c um modus determinado do fazer-ver, λόγος não deve ser tratado


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Martin Heidegger (GA 2) Ser e Tempo (Castilho)